domingo, 25 de setembro de 2011

Bárbara Heliodora: uma são-joanense na História

     Bárbara Heliodora (*) foi uma das musas da Inconfidência. Seu nome completo era Bárbara Heliodora Guilhermina da Silveira. Teria nascido em fins de 1758, na cidade de São João Del Rei. Para alguns estudiosos, era descendente de uma das famílias paulistas mais ilustres: a de Amador Bueno, o Aclamado. 
     Alvarenga Peixoto e Bárbara Heliodora viveram juntos por algum tempo, só se casaram, por portaria do bispo de Mariana, de 22 de dezembro de 1781, quando Maria Ifigênia, filha do casal, já contava três anos de idade.
      Desta união nasceram quatro filhos. Os estudiosos de Bárbara Heliodora fazem sempre menção à beleza de sua filha Maria Ifigênia. Segundo Joaquim Norberto “tão formosa aos doze anos que lhe deram o nome de princesa do Brasil e essa antonomásia tornou-se popular”.
      Alvarenga Peixoto foi preso em 1789. Em abril de 1792, teve sua sentença de morte declarada, sendo comutada, em 2 de maio 1793, para a de degredo e seus filhos e netos foram declarados infames. Diz a tradição que, quando os inconfidentes foram traídos, Alvarenga Peixoto, querendo amenizar a pena que receberia, pensou em denunciar ao Visconde de Barbacena os pormenores da revolução. Antes, porém, resolveu conversar com sua esposa que o dissuadiu de tal intento. 
     Os bens do casal foram seqüestrados em 1789, por ocasião do degredo de Alvarenga Peixoto. Depois, Bárbara Heliodora solicitou a devolução de metade de seu patrimônio, pois era casada “com carta de metade” alegando que de seu matrimônio existiam filhos. No que foi atendida.
     A poetisa viveu entre a Vila de Campanha da Princesa e a de São Gonçalo de Sapucaí. Segundo alguns nossa poetisa foi declarada demente e teria morrido em maio de 1819, na freguesia de São Gonçalo do Sapucaí, mas de acordo com o espólio não morreu tão desgraçada como querem alguns autores. Quanto ao problema da demência de Bárbara há alguns esclarecimentos que precisam ser feitos. Domingo Carvalho da Silva baseado em documentos informa que foi uma manobra usada para anular uma escritura de venda de bens. Mas João Evangelista de Alvarenga declara “ao dito seu pai que por amor do Brasil foi degredado, perdendo sua mãe o juízo”, dizendo depois, em 1813, achar-se sua mãe “possuída de uma contínua melancolia”.
      A história de que Bárbara Heliodora teria morrido demente, recitando poemas pelas ruas de Campanha, com os cabelos soltos, desgrenhados, olhar desvairado e vestidos rotos é um mito. Provavelmente, em decorrência dos problemas que enfrentou, ela tenha passado por um estado de depressão que, mal interpretado, deu origem a sua propagada loucura. 
      A produção literária de Bárbara Heliodora é bastante reduzida e controvertida. A ela são atribuídos os poemas “Conselhos a meus filhos” e um soneto dedicado a Maria Ifigênia, mas nem todos os estudiosos são unânimes nesta atribuição.
     Mito ou verdade, a sua vida e a sua poesia compõem um quadro necessário à configuração de um momento crítico na cultura da metrópole. As minas de ouro já se haviam esgotado, o governo português apertava o cerco com impostos excessivos, os garimpeiros iam-se fixando noutra atividade, de agricultura e de pastoreio. A linguagem do símbolo ia perdendo a sua base e a imaginação do homem brasileiro começava a se soltar, dessacralizando valores até então indiscutíveis.

(*) Alguns estudiosos se detêm na grafia de seu prenome. Uns grafam com H outros com E. Segundo o Dicionário etimológico de Antenor Nascentes, diz provir Heliodoro, do grego Heliodoros, de Hélio, Hélios, o deus do sol, e dôron, presente do sol, pelo latim Heliodoru. Aureliano Leite não aceita esta grafia, diz o estudioso “que prefere grafar Heliodora com E não só porque era assim que se assinava, mas também porque por Eliodora, com E, se conhece uma variedade de tulipa, flor. Pode pois o seu nome não se originar de Helios, nem ser o feminino de Heliodoro, como quer Basílio de Magalhães. Ela era Eliodora, como outras são Hortênsia, Rosa, Violeta, etc. Acrescente-se que o seu marido sobressaía entre os contemporâneos pela cultura clássica e não iria admitir que ela escrevesse errado o próprio nome”.

Fonte: Nem só de Drummond e   Guimarães Rosa vive a literatura mineira, de Eliane Vasconcellos (Doutora em Letras e Chefe do Arquivo-Museu de Literatura Brasileira da Fundação Casa de Rui Barbosa), in http://www.amulhernaliteratura.ufsc.br/.



sábado, 3 de setembro de 2011

BORDADOS: PÁGINAS DE UMA ESTÓRIA

Existem pessoas que conseguem traduzir sentimentos em palavras... Existem pessoas que com palavras produzem emoções diversas... Sem dúvida alguma Jaqueline Menezes Farias Tarôco ("flor do dia") é uma destas pessoas. Com o comentário transcrito abaixo, ela expressou toda sua sensibilidade, carinho e respeito pelas mulheres bordadeiras do Centro Cultural Feminino de São João del-Rei, bem como por todas aquelas que com suas mãos sensíveis bordam estórias, revelam memórias, traçam novos caminhos:
Eu amo bordados e não os vejo como simples pedaços de pano para adornos domésticos. Vejo-os como obras de arte, como pinturas ou mesmo como páginas de uma estória. Não resta dúvida de que todos os bordados são lindos, mas o interessante no ato de bordar é o trabalho de memória que é desenvolvido pelas bordadeiras. Cada paninho bordado é carregado do jeito delicado de cada uma delas. Em momentos mágicos elas se unem, e como fadas com suas “agulhas de condão”, pregam, fixam e costuram sobre os tecidos, sem vida, as suas experiências de mulheres. Suas linhas, entrelinhas e pontos marcam o pano como se fossem linhas do tempo em rostos da maturidade. De cabeça baixa, com minuciosa atenção, o livro da memória vai sendo confeccionado. Já não são tecidos sem vida. Encorparam-se, enriqueceram-se, tornaram-se memórias. Memórias de mulheres diversas, mulheres meninas, mulheres tristonhas, simplesmente mulheres. Por terapia ou simplesmente por amor aos pontos e laçadas, elas caminham juntas. Juntas e separadas. Juntas no prazer, separadas pelas experiências. Através das trocas e coincidências elas caminham bordando, tecendo memórias. Deixam sobre o tecido suas alegrias, realizações, preocupações, angústias, suspiros profundos e bordam, bordam para “terapiar”, bordam para acalmar, bordam para aliviar. Não sabem, mas simplesmente bordam por amar. Amar a vida, amar o próximo, as amigas e a si mesmas. Juntas confeccionam um grande livro de contos, causos, notícias da Gazeta e boatos dos vizinhos. E entre tudo isso caminham a agulha e a linha, que seguem juntas obedecendo as mãos das bordadeiras, das escritoras de memórias. A agulha - a caneta, a linha - a tinta que segue riscando e deixando grafadas no tecido as experiências, as dores e as delícias das bordadeiras do CCF. Parabéns, meninas, pela arte que aflora das suas mãos, que unem páginas de uma grande estória de vida. (JMFT)